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Imunidade de ITBI na integralização de imóveis em capital social: possível vitória dos contribuintes?

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  • há 6 dias
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O Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) é um tributo de competência municipal incidente sobre transmissões onerosas de propriedade imobiliária. Apesar de, na maior parte dos casos, ter os termos de sua aplicação bem consolidada, o ITBI ainda gera discussões relevantes e pode, em breve, gerar grandes mudanças para o contribuinte.


O dilema gira em torno do artigo 156, §2º, inciso I da Constituição, que institui que o ITBI não incidiria sobre a transmissão de bens incorporados ao capital social, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção da pessoa jurídica, a menos que a atividade preponderante da empresa tenha fim imobiliário (compra, venda, ou locação de imóveis).


“Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (…) § 2º O imposto previsto no inciso II:

I – não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil.


Atualmente, a interpretação atribuída ao artigo e a ressalva nele colocada tem como consequência a incidência do imposto sempre que há transferência de imóveis de pessoas físicas para pessoas jurídica que tenham fim predominantemente imobiliário (como holdings imobiliárias), gerando um enorme impacto financeiro, especialmente na estruturação de um planejamento patrimonial. No entanto, isso pode estar prestes a mudar.


Em outubro de 2025 iniciou-se o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1.495.108 Supremo Tribunal Federal, que discute a especificidade da incidência do ITBI em procedimentos de integralização de imóveis para o capital social de pessoas jurídica com fim imobiliário. De modo contrário ao entendimento atual das autoridades fiscais, os ministros do STF têm, até o presente momento, apresentado votos favoráveis à tese favorável ao contribuinte, que atrairia a imunidade do imposto para transferência desses bens no seu uso para integralização em capital social.


Essa conclusão deriva da interpretação de que a ressalva proposta no referido artigo constitucional se aplicaria apenas para as operações societárias descritas na segunda parte do dispositivo, ou seja, fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, não se aplicando à mera integralização de capital, mesmo que o objeto social da entidade seja de atividade imobiliária.


Essa distinção é fundamental para a compreensão da imunidade. No entendimento favorável aos contribuintes, a intenção do legislador constituinte teria sido clara ao desonerar a formação e o aumento do capital social de sociedade, facilitando a integralização de bens imóveis e estimulando a atividade econômica. A imunidade, nesse contexto, atua como um mecanismo de incentivo ao investimento e à capitalização das empresas, evitando que a carga tributária inicial se torne um entrave para o desenvolvimento de novos negócios ou para a expansão dos existentes.


Divergências e judicialização

No entanto, apesar da aparente clareza do texto constitucional, a aplicação dessa imunidade tem sido objeto de interpretações divergentes. Muitos municípios, baseando-se no artigo 37 do Código Tributário Nacional (CTN), que condiciona a imunidade à inexistência de atividade imobiliária preponderante por parte da empresa adquirente, têm insistido na cobrança do ITBI mesmo em casos de integralização de capital. O CTN, por ser uma norma infraconstitucional, não poderia, em tese, limitar uma imunidade prevista diretamente na Constituição. Essa tensão entre a literalidade constitucional e a interpretação restritiva do CTN tem sido a fonte primária de insegurança jurídica e de grande parte dos litígios judiciais.


Diante da multiplicidade de entendimentos e da crescente judicialização da matéria, o Supremo Tribunal Federal buscou pacificar, em 2020, a questão por meio do julgamento do RE nº 796.376/SC, o qual deu origem ao Tema 796 da Repercussão Geral. A tese firmada pelo STF à época foi a seguinte:


“A imunidade em relação ITBI, prevista no inciso I do § 2º do artigo 156 da Constituição, não alcança o valor dos bens que exceder o limite do capital social a ser integralizado.”


Inicialmente, esperava-se que essa tese trouxesse clareza e uniformidade à aplicação da imunidade. Contudo, a redação da tese gerou uma nova onda de controvérsias. Muitos municípios interpretaram que a imunidade se aplicaria apenas ao valor do imóvel correspondente ao capital social integralizado, permitindo a cobrança do ITBI sobre a diferença entre o valor de mercado do imóvel (valor venal) e o valor pelo qual ele foi integralizado ao capital social. Essa interpretação levou à exigência do imposto sobre o valor excedente, alegando que este não estaria abrangido pela imunidade constitucional. Essa interpretação, no entanto, desvirtua o propósito da imunidade, que é desonerar a operação de integralização como um todo, e não apenas uma parcela dela.


Tema 1.348

O próprio STF, em decisões posteriores ao Tema 796, reconheceu que a controvérsia tratada naquele julgamento era específica e se referia à constituição de reserva de capital, e não à diferença entre o valor venal do imóvel e o valor integralizado ao capital social. Isso significa que o Tema 796 não deveria ser aplicado indiscriminadamente para justificar a cobrança do ITBI sobre o valor excedente em todas as operações de integralização. Essa nuance, porém, não foi suficiente para eliminar a insegurança jurídica, e os tribunais inferiores continuaram a proferir decisões divergentes, ora acolhendo a tese municipalista, ora defendendo a imunidade plena.


Diante da persistência da controvérsia e da necessidade de uma definição clara sobre o alcance da imunidade do ITBI, o STF reconheceu a repercussão geral no RE nº 1.495.108/SP, que deu origem ao Tema 1.348. Esse novo tema busca definir o “alcance da imunidade do ITBI, prevista no inciso I do § 2º do artigo 156 da Constituição, para a transferência de bens e direitos em integralização de capital social, quando a atividade preponderante da empresa é compra e venda ou locação de bens imóveis”.


O julgamento do RE 1.495.108/SP foi iniciado em 3 de outubro de 2025. O ministro relator, Edson Fachin, apresentou um voto que pode ser decisivo para a pacificação do tema de forma favorável aos contribuintes. Ele propôs que a imunidade do ITBI na integralização de capital é incondicional, ou seja, não está sujeita à verificação da atividade preponderante da pessoa jurídica. Segundo o ministro, a exceção da atividade preponderante se restringe apenas às operações de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, e não à formação inicial do capital social.


A tese proposta pelo ministro Fachin seria a seguinte:


“A imunidade tributária do ITBI, prevista no art. 156, § 2º, I, na realização do capital social mediante integralização de bens e valores, é incondicionada, portanto, indiferente a atividade preponderantemente imobiliária.”


As aplicações práticas dessa possível mudança de interpretação constitucional têm impactos significativos para planejamentos patrimoniais e sucessórios. A tributação sobre a receita operacional da pessoa jurídica imobiliária no que tange a aluguel, por exemplo, tende a ser consideravelmente menor do que aquela incidente sobre a renda de aluguel auferida por pessoa física.


Assim, atualmente, a integralização dos imóveis em pessoa jurídica é normalmente mais eficiente do ponto de vista tributário no longo prazo, mas deve-se considerar um alto custo inicial não apenas de ITBI, mas também cartorário. Com a mudança de interpretação da legislação, esse custo vai ser reduzido de forma significativa, tornando ainda mais atrativa essa reorganização.


A principal mudança seria a maior segurança jurídica para as operações de integralização de imóveis em capital social. A pacificação do tema eliminaria a incerteza gerada pelas diferentes interpretações e decisões judiciais conflitantes. A imunidade seria aplicada de forma ampla e incondicionada, sem a necessidade de verificação da atividade preponderante da pessoa jurídica no momento da integralização. Isso reduziria drasticamente o número de litígios judiciais entre contribuintes e municípios, que atualmente insistem na cobrança indevida do imposto com base em interpretações restritivas ou na diferença entre o valor venal e o valor integralizado. A previsibilidade jurídica é um fator essencial para o ambiente de negócios, e a tese pró-contribuinte contribuiria significativamente para isso.


Conclusão

Dessa forma, compreende-se que a mudança em curso no STF beneficia o contribuinte e a organização patrimonial reduzindo a carga tributária sobre a integralização de imóveis, inclusive quando realizada em pessoas jurídicas de fim predominantemente imobiliário, além de trazer mais segurança para uma interpretação historicamente controversa. Por enquanto votam favoravelmente o ministro relator Edson Fachin, acompanhado do ministro Alexandre de Moraes e do ministro Cristiano Zanin. Em sequência, o ministro Gilmar Mende requereu vista aos autos, e o julgamento está suspenso até o retorno do ministro (que tem prazo de 90 dias conforme regimento interno do STF).


Tendo em vista esse panorama, recomenda-se que as pessoas físicas e jurídicas reavaliem seus planejamentos patrimoniais à luz da jurisprudência em evolução, e considerem a tomada de medidas preventivas até a conclusão definitiva do julgamento. Como exemplo, existe a possibilidade de impetração de mandado de segurança preventivo, com o depósito judicial do valor de ITBI, para discussão do tema.


Fonte: Site ConJur - Ana Beatriz Cammarota e Marina Guimarães em 08 de novembro de 2025

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